Em seu último livro "Marketing
3.0", o guru mercadológico Philip Kotler defende que as marcas do futuro
devem estar pautadas principalmente em dois fatores: sustentabilidade &
reputação da marca.
Conforme o autor, poucas organizações atuam
dentro desta ótica nos dias atuais. Mas esta é uma tendência inevitável para as
marcas que desejem tornar-se relevantes para os clientes e garantirem a sua
continuidade.
É uma nova tendência, que particularmente
muito me agrada. Visualizar os gigantes do capitalismo não apenas utilizando
seus recursos publicitários para competirem e induzirem ao consumo, mas para
promover novos debates, posicionar-se em prol do desenvolvimento de uma
sociedade justa e equilibrada. Enfim, tentar ocupar um lugar na mente do
consumidor como uma marca do bem, que além de vender um produto ou um serviço,
tenta dar a sua contribuição por um mundo melhor.
É um caminho árduo e que depende da
conscientização das organizações. Parece distante, mas não impossível.
Claro que tudo pode ser uma enganação também.
Empresas podem investir na criação de uma determinada imagem, mas na realidade, em seu
processo produtivo, podem agir de outra forma. Mas com redes
sociais, compartilhamento de informações, públicos e concorrentes fiscalizando,
a sua "boa" imagem pode tornar-se um tiro no pé por ser falsa e, ainda, fortalecer as denúncias, vídeos e fotos que demonstrem o contrário.
Como disse Abraham Lincoln:"Você pode
enganar uma pessoa por muito tempo; algumas por algum tempo; mas não consegue
enganar a todas as pessoas por todo o tempo."
Portanto, para ser 3.0, uma marca precisa
criar esta reputação positiva através de seu posicionamento estratégico, de sua
atuação sustentável em todas as suas ações e de sua comunicação com a sociedade.
Mas o que é ser sustentável? Basicamente é
possuir este quatro fatores:
1- Obter lucro
2- Respeitar pessoas
3- Preservar o meio ambiente
4- Atuar em prol da cultura e da diversidade
Apenas é sustentável quem atinge resultados
de mercado sem prejudicar pessoas, meio ambiente ou questões de diversidade,
seja racial, sexual, cultural, com relação a minorias... Enfim, exige um
comportamento ético e em prol de uma sociedade melhor.
Parece até absurdo que em meio a este
capitalismo voraz surja esta filosofia de gestão. Mas é o que defende Kotler e,
pensando numa perspectiva de futuro, pode ser que as pessoas comecem a
valorizar quem atua junto a elas e não quem apenas pensa nos seus ganhos.
Vai resolver os problemas do mundo? Não sabemos. E sim, parece um pensamento utópico. Mas este já demonstra ser um melhor caminho do que tradicionalmente as organizações estão seguindo hoje.
Algumas marcas já tem investido nessa linha
de trabalho e obtido excelentes resultados, com comerciais que perpassam as
mídias tradicionais e viralizam nas redes.
Podemos até citar alguns:
Pantene - Emocionante comercial, aborda
determinação, bullying, afeto com família, idosos...
Always - # Like a girl - Considerado o melhor
comercial do último Super Bowl deste ano (horário mais caro da propaganda mundial). Aborda a violência simbólica no discurso que
taxa de "fazer algo como
menina" de uma coisa negativa:
Aqui também temos uma orientação do Carrefour, sobre como agir com o público LBGTS, para os seus
colaboradores:
E tivemos nesta semana o comercial do Dia dos
namorados da Boticário:
O comercial da Boticário é uma bela produção.
É atual, sutil, defende o amor e a diversidade.
O que mais chamou a atenção foi o tamanho da repercussão causada por uma mensagem discreta, que prima pela igualdade, mas
que gerou inúmeros pedidos de boicote.
Acaba sendo mais um indício de que há um crescente
sentimento conservador e alguns posicionamentos religiosos radicais e perigosos no Brasil, que desejam uma sociedade mais dura e rígida com as minorias, desconsiderando as desigualdades sociais, a diversidade cultural da nação e contrariando toda
a tendência abordada até aqui.
Esta percepção gera um certo receio
com o futuro. Pois ainda há um longo percurso a ser percorrido. Mas, também, neste mesmo contexto, o
comercial torna-se ainda mais relevante por estimular um debate atual e necessário.
Aos radicais, que não aprovaram o comercial e sugerem um boicote, dá até para aumentar o leque de marcas que
devem ser boicotadas (todas elas defendem a diversidade sexual):
O Pastor Silas Malafaia terá trabalho em promover tanto boicote. Ainda mais que não poderá utilizar equipamentos tecnológicos, sistemas e nem redes sociais para continuar gravando e divulgando seus vídeos.
Clique e confira marcas e campanhas que apoiam a diversidade sexual: http://aproveitaeboicota.tumblr.com/
Concordo que os exageros, independentemente
de opção sexual, devem ser questionados (o que não é o caso do comercial da
Boticário). Comportamentos obscenos em público, letras e coreografias sexistas
de músicas, apelos sexuais inapropriados em novelas, programas de reality show, humor que deprecia minorias e a publicidades consumistas e irresponsáveis.
Acaba que o debate não é coerente. Muitos comportamentos
questionáveis são aceitos pela sociedade que hipocritamente renega outros.
Itaipava - Vai Verão - Mais um vídeo que reduz
a mulher a um objeto do prazer masculino:
Apenas um dos muitos equivocados comerciais
da skol:
Skol acusada de apologia ao estupro. Campanha
foi retirada por ordem judicial:
E, apenas para não perder o embalo do texto, todos os programa do Amaury Jr. Primeiro porque não é de bom gosto, é brega ao extremo.
Exalta pessoas por troca de favores ou venda de cotas de patrocínio, numa falsidade de dar pena e, ainda,
esfrega no rosto de uma população de baixa renda a ostentação esnobe de quem
está no topo da cadeia de riquezas. É descaradamente uma gigantesca violência
simbólica.
Ou a venda de produtos religiosos por preços astronômicos. Como as canetas ungidas para concursos:
Ou o sistema de campanha política que, independentemente de partidos, permite uma publicidade totalmente mentirosa e consome rios de dinheiro com mega produções, beneficiando aproveitadores e empresas investidoras.
Não julguemos os outros pelo que cegamente acreditamos. Precisamos cultivar a tolerância, o bom senso, a harmonia, tomarmos banhos de humanização e fazermos discussões mais efetivas por um mundo melhor.
Precisamos deixar de dar ouvidos para os barraqueiros equivocados de plantão. Tudo se discute na sociedade moderna, menos o que é importante para a sua transformação. Enfim, tem muita coisa pior para se preocupar do que a publicidade do Boticário.
Quem sabe assim o mundo não fica um pouquinho melhor.